A tradição das Lapinhas caiu muito em João Pessoa, embora tenha sido forte em outros tempos. Na época de menino, lembro bem das que aconteciam no Cordão Encarnado, já que morava no Centro. Para os que não sabem, o Cordão Encarnado é toda a área urbana que se situa a partir do Pavilhão do Chá (Praça Venâncio Neiva) até as proximidades do Cemitério Senhor da Boa Sentença. Dentro do espaço situado entre as ruas índio Piragibe, São Miguel, Nina Lima (que continua a João Machado até o Cemitério), e Rodrigues Chaves. O próprio nome “Cordão Encarnado” decorre justamente da tradição da Lapinha, representação de tipo teatral, nos períodos natalinos, mais largamente conhecido como Pastoril (originalmente, o nome mesmo do folguedo enquanto a Lapinha representava a tradição das montagens do cenário onde nasceu Jesus, o que conhecemos por presépio). Mas não se limitavam ao Cordão Encarnado as representações desses autos de Natal, em João Pessoa. Cruz das Armas, Mandacaru, Torre, Tambaú e Róger também tinham seus autos a disputar a preferência do público pessoense. Há em Cruz das Armas e Mandacaru redutos culturais que mantêm a tradição, assim como, na Grande João Pessoa, também em Cabedelo, Bayeux e Santa Rita. Representam a devoção das pastoras ao nascimento de Jesus Cristo, elas, as pastoras, divididas em dois cordões: o Encarnado, que simboliza Nossa Senhora, e o Azul, Jesus Cristo. Durante a apresentação, elas dançam e cantam em louvor ao Menino Jesus. A mestra comanda o Cordão Encarnado, e a contramestra, o Azul. Ao centro, a Diana, vestida metade-metade de vermelho e azul, mediadora das rivalidades. Existem algumas maiores que incluem a borboleta, a cigana, o anjo, entre outros personagens. A disputa entre os cordões é, o mais das vezes, ferrenha. Em meio à peleja, o povo em geral e, destacadamente, comerciantes e políticos colaboram financeiramente com o cordão preferido. O lado que arrecada mais é o vencedor. As pastoras, com pinturas e adereços, cada qual metida em sua cor, desviam olhares furtivos e dissimulados aos assistentes, conquistando corações e apoios. Um tipo de manifestação que, juntamente com outras que fizeram a história cultural pessoense, bem que poderiam novamente ser incentivadas. Afinal, as tradições constituem peça central na formação da identidade cultural de um povo. Elas ajudam as pessoas a se sentirem parte de uma comunidade, conectando-as por meio de uma herança comum, justamente o elemento a ser preservado.
Sérgio Botelho –É JORNALISTA e MEMORIALISTA, escreve todas terças, quintas e sábados
(Crédito da foto: Prefeitura de Recife)